Sunday, May 17, 2009

Ao calçar o pôr-do-sol...

Curvou-se para aconchegar no pé o sapato que com tanto cuidado acabaras de lavar. Forçou o pescoço, entortou uma qualquer parte do ombro e, julgando ter desmanchado algum pequeno osso, afrouxou os pensamentos.

Desapertou as lembranças que lhe estrangulavam o gargalo entortado, e levou-as até ao café central, que agora é pizzeria, decerto com “a” em lugar do “e”. Tempo de peixe, esse, onde ainda recentemente se saborearam memórias.

Mas… espera! Parece-me que uma outra voz mais longínqua quer também reclamar a sua dita!
Ah, sim, é a bisteca que te sorriu da ‘Galleria’, em dia de notas soltas por um famoso violino.

E…

E se o desviasses do caminho, contando-lhe histórias de reis que o levavam ao café? E se de cada vez que te acompanhasse nesse desvio o presenteasses com mais um apagador para a colecção?

Os seus sapatos continuam limpinhos, agora que os conseguiu ajeitar.

Mas no meu sonho eram sandálias de luz, que me fugiam do pé à devida velocidade. Eram feitas de pôr-do-sol, as minhas sandálias. E queimavam-me os pés, como as memórias.

Tons alaranjados flutuavam abaixo, e deixei-me subitamente tombar neles. Hmmm… como eram macios!

Alguém lhe tocou ao de leve no ombro que já não se sentia queixoso. Voltei-me, depois da queda amortecida, mas já não vimos ninguém…

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